quarta-feira, 6 de junho de 2012

ARTIGO CIENTÍFICO: AS INVERSÕES DE LETRAS NA ESCRITA O "FANTASMA" DO ESPELHAMENTO. AUTOR: ZORZI (2000)

No artigo científico "AS INVERSÕES DE LETRAS NA ESCRITA O FANTASMA DO ESPELHAMENTO", o autor Dr. Jaime Zorzi, propõe as seguintes reflexões:

"Se os problemas perceptuais não dão conta de responder às questões acerca da dislexia, poderíamos encontrar outras razões que justificassem a ocorrência de inversões e espelhamentos, considerando-se que este é um fato comum na vida das crianças que estão iniciando o aprendizado da escrita?
Será possível explicar estas "alterações" com argumentos que possam ir além das já conhecidas explicações que fazem referência a falhas na percepção visual, na lateralidade, no esquema corporal, em noções espaço-temporais e assim por diante e, acima de tudo, que possam retirar de tais ocorrências o caráter patológico a elas fortemente associado?"

No decorrer do artigo, o autor formula e fundamenta uma nova hipótese que recorre a noções relativas ao desenvolvimento cognitivo infantil, de acordo com o que Piaget porpõe como noção de permanência do objeto e da invariância.O autor tece um interessantíssimo trabalho e conclue com o seguinte:


"Por muito tempo e, de modo bastante insistente, temos sido levados a ver, nos erros e enganos que as crianças fazem ao escrever, indícios de distúrbios e patologias. Os espelhamentos de letras são um exemplo típico desta maneira, até mesmo parcial e distorcida, de compreendermos o que é a aprendizagem.

Estamos, como adultos, fortemente contaminados com noções rígidas de "certo" e "errado": se a criança está agindo ou pensando da mesma forma que nós, então ela sabe, ela está certa, está aprendendo. Caso contrário, se ela assimila, ou entende uma situação de uma maneira distinta da nossa, que não está de acordo com nossas concepções e crenças, então ela está errada. Não está aprendendo. E, se não está aprendendo, então deve ter dificuldades, problemas, e assim por diante. 

Para nós é tão óbvia a distinção entre um p e um q, ou entre um b e um d, que não conseguimos imaginar como a criança não vê esta diferença tão facilmente. Não podemos imaginar como ela pode estar adotando uma perspectiva distinta de análise. 

Enquanto que, para nós adultos, parece não haver outro modo de ver um p a não ser exatamente na posição que o convencionamos desenhar, para a criança um p poderia continuar sendo um p, mesmo que fosse colocado em diferentes posições no espaço. E isto porque ela poderia estaria levando em consideração as propriedades constantes ou invariáveis do objeto e não um propriedade eventual, externa às relações espaciais intrínsecas ao mesmo. 

De modo semelhante, podemos considerar os enganos ou erros que a criança comete quando procura regularizar o som das letras sem se dar conta que a ordem e o contexto de ocorrência dentro da palavra podem estar determinando mudanças no valor sonoro das letras. Devemos partir do princípio que a língua escrita pode ser considerada como um objeto cultural, repleto de convenções e arbitrariedades que a criança não nasce dominando.

Como objeto cultural, a língua deve ser ensinada. Portanto, cabe ao adulto torná-la acessível à criança e para tanto, deverá ele adulto também conhecer de modo mais minucioso aquilo que está se propondo a ajudar alguém a aprender. Cabe também ao adulto compreender que enganos e erros fazem parte do aprendizado e que existe uma tendência de superação na medida em que a criança vai dominando as características do sistema de escrita. 

Por outro lado, merecem uma atenção e análise mais cuidadosa aquelas crianças que, apesar do contato com a escrita e das oportunidades que têm para tal aprendizado, revelam dificuldades mais significativas, sistemáticas e duradouras para compreender o funcionamento da escrita.

Cabe encerrar este artigo enfatizando a necessidade de se diferenciar patologia e normalidade. Tem ficado evidente a tendência de patologização quando observamos fatos no aprendizado os quais mal compreendemos. Quando alguma coisa foge dos parâmetros daquilo que, também de modo convencional, acreditamos ser o certo, a opção é a de atribuir distúrbios, disfunções e assim por diante. 

A definição de dislexia parece não ter fugido desta tendência e, podemos afirmar, somente será possível conhecer de modo mais aprofundado o que ela pode estar significando, na medida em que muito esforço for
dirigido no sentido de compreendermos o chamado desenvolvimento normal da aprendizagem da língua escrita, levando-se em conta, como buscou-se fazer neste artigo, os modos típicos com os quais as crianças constróem seus conhecimentos."
Recomendo a leitura da íntegra deste artigo, disposto no link: "As inversões de letras na escrita, o fantasma do espelhamento."

Grande abraço!

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