Respostas para Dúvidas Frequentes na Área de Fonoaudiologia Educacional - Primeira Parte.
Conteúdo retirado do material disponibilizado pela Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia,
por meio do Departamento de Fonoaudiologia Educacional.
A comunicação humana é um elemento indispensável
para que haja um bom desenvolvimento e aprendizado.O fonoaudiólogo é o profissional que possui
formação técnica e científica, além da habilitação legal (Lei 6.965/1981), para
cuidar de todos os aspectos relacionados à comunicação humana.Fonoaudiologia educacional é uma das áreas de especialização
reconhecida pelo Conselho Federal de Fonoaudiologia (Resolução 382/2010).
Inserido no contexto educacional, o fonoaudiólogo assume
o papel de educador e passa a ser cor responsável, junto com os demais
profissionais que devem compor a equipe multidisciplinar educacional, pelo
êxito no processo de ensino-aprendizagem, promovendo o pleno desenvolvimento
das potencialidades comunicativas, cognitivas, afetivo-emocionais e
sociais dos estudantes.
Estudos mostram que o Brasil tem um dos piores indicadores
em educação. Dentre outros fatores, destaca-se um número significativo de
crianças e jovens que não conseguem ser alfabetizados em virtude de problemas
relacionados à comunicação ou por não se adaptarem à proposta pedagógica. Muitos
desses problemas podem ser facilmente resolvidos na própria escola se a equipe
educacional estiver devidamente formada e instrumentalizada.
Assim, a atuação do fonoaudiólogo educacional será
determinante para promover a aprendizagem e prevenir boa parte dos problemas
que podem afetá-la.
O trabalho do Fonoaudiólogo na Educação é coisa recente?
Não, apesar
de ser reconhecida como especialidade há pouco tempo, a Fonoaudiologia no
Brasil surgiu para ajudar professores a solucionar problemas de crianças que
não aprendiam, por possuírem alguma dificuldade de comunicação. Portanto,
Fonoaudiologia e Educação têm uma relação colaborativa bastante antiga.
O Fonoaudiólogo Educacional pode colaborar com quais níveis e modalidades de ensino?
Como a comunicação possui estreita relação com a
capacidade que os indivíduos, em qualquer fase do desenvolvimento, têm para
aprender, ela será necessária em qualquer situação de ensino-aprendizagem.
Portanto, o fonoaudiólogo educacional pode colaborar em todos os níveis ou
modalidades de ensino.
Entretanto, dada a importância que as “primeiras
aprendizagens”, como a alfabetização, assumem para as “futuras aprendizagens”
da criança, pois uma criança que não estiver bem alfabetizada terá dificuldades
em todas as disciplinas do currículo escolar, o trabalho do fonoaudiólogo
educacional torna-se decisivo na educação infantil, na educação especial e no ensino
fundamental.
De que forma o Fonoaudiólogo Educacional pode colaborar com os temas do cotidiano escolar?
Inserido no contexto educacional, o fonoaudiólogo
assume o papel de educador, sendo um importante especialista para discutir temas
e dúvidas como as que serão apresentadas a seguir.
Como o Fonoaudiólogo Educacional pode ajudar a lidar com os transtornos de aprendizagem?
O fonoaudiólogo educacional é um dos principais
especialistas para orientar, junto com a equipe educacional, professores e
familiares de crianças com transtornos de aprendizagem, inclusive acompanhando
o andamento dos tratamentos realizados fora da escola (quando indicados).
Toda criança que não aprende tem algum problema?
Infelizmente, dentro de nossa cultura educacional,
a criança que tem dificuldades para aprender sempre é vista como tendo algum
problema em nível individual, como se ela sempre fosse a culpada pelas
limitações que possa apresentar. Porém, esta crença não corresponde à verdade.
Estima-se que apenas cerca de 10% das crianças
possam ter algum tipo de problema intrínseco, que possa prejudicar a aprendizagem,
como nos casos, por exemplo, de dislexia, discalculia, deficiência mental ou
autismo. Na realidade, a maior parte das crianças que estão com dificuldades de
aprendizagem podem estar refletindo problemas de outra natureza, como
limitações nas oportunidades para aprender, déficits pedagógicos ou
metodológicos, problemas de natureza socioeconômica e assim por diante. É importante
saber distinguir os verdadeiros e os falsos problemas de aprendizagem, uma vez
que eles podem se manifestar de modos semelhantes. O fonoaudiólogo educacional,
juntamente com a equipe educacional, colabora com a identificação precoce dos
verdadeiros problemas de aprendizagem.
Qual o melhor método de alfabetização?
Crianças sem dificuldades mais significativas, que
tenham demonstrado um bom desenvolvimento geral, e em especial de linguagem
oral, que tenham tido muita oportunidade de conviver com pessoas que lêem e escrevem,
que estão habituadas com leituras dirigidas para elas, e outras situações
bastante favoráveis, não apresentam, de modo geral, problemas para serem
alfabetizadas, qualquer que seja o método.
Por outro lado, crianças com dificuldades e ou com
falta de oportunidades para vivenciar situações ricas de interação com a
leitura e a escrita, serão desafiadoras para a maior parte dos métodos e para
os professores que os aplicam. Porém, considerando a natureza alfabética de
nossa escrita, que tem como base uma forte relação entre a fala e a escrita,
mais especificamente entre os sons da fala e as letras usadas para escrever, os
métodos ou abordagens fônicas têm se mostrado bastante efetivos para diminuir
dificuldades na alfabetização e garantir progressos mais consistentes no
processo de alfabetização.
Como desenvolver o gosto pela leitura?
Encontramos crianças que “adoram” ler e, por outro
lado um número grande de outras
que “detestam” ler. Um dos fatores fundamentais
nesses tipos de sentimentos diz respeito às experiências que cada criança teve
ao longo de sua vida. Aquelas crianças que, desde pequenas, vivem com adultos
que lêem para elas, que as encantam com os contos e histórias que os livros
trazem, assim como estimulam sua imaginação e criatividade através das
leituras, são privilegiadas. O adulto que lê com prazer para levar também
prazer até a criança lança mão de uma fórmula bastante eficaz para desenvolver
o gosto pela leitura.
Leiam bastante para os pequenos, desde muito cedo.
Permita que eles descubram os encantos das palavras que estão nos textos. Mas
muito cuidado: não façam destes momentos de intensa troca afetiva entre pessoas
e livros, uma atividade pedagógica, professoral, na qual a criança,
obrigatoriamente tem que aprender uma porção de coisas.
É possível identificar possíveis problemas de aprendizagem quando a criança ainda é pequena?
A identificação de problemas está diretamente
ligada ao grau de dificuldades que a criança apresenta. Algumas são evidentes
desde o desenvolvimento de bebê, como é o caso dos atrasos na evolução
neuropsicomotora. Outras alterações podem ser mais sutis e difíceis de serem
identificadas prontamente.
De qualquer modo, fiquem sempre atentos ao desenvolvimento,
principalmente da linguagem da criança. Atrasos no aparecimento da linguagem
falada, dificuldades para adquirir vocabulário, dificuldades para formar frases
de acordo com o esperado para a idade, dificuldades com a fala (omissões e
trocas de fonemas), limitações na compreensão da linguagem oral, dificuldades
para dialogar, para iniciar interações, para responder para os outros,
dificuldades para acompanhar as atividades típicas da idade e dificuldades para
relacionar-se e brincar, podem ser indicativos de problemas de aprendizagem e desenvolvimento.
Sempre que houver uma suspeita de problemas de comunicação, o fonoaudiólogo
deve ser procurado.
Problemas de linguagem oral podem prejudicar o aprendizado da escrita?
Crianças que apresentam uma história de problemas
na linguagem oral, como atrasos, dificuldades de compreensão, de expressão das
ideias e também de fala, tendem em geral, a projetar tais dificuldades no
aprendizado da leitura e da escrita, o que pode prejudicar o processo de
decodificação e compreensão leitora, de elaboração de textos e também da
ortografia. Dai a importância de se detectar, o mais cedo possível, crianças
que apresentam tais dificuldades para que possam ser devidamente atendidas em
suas necessidades educacionais e de acompanhamento fonoaudiológico.
A criança que espelha letras tem problemas de lateralidade ou de dominância cerebral?
Tal preocupação não procede. Espelhar letras é
muito comum nas crianças pequenas, principalmente quando começam a desenhar
letras com mais precisão. Este comportamento é normal e, em geral, rapidamente
tende a desaparecer quando a criança começa a compreender que, no caso da
escrita, a posição e a direção do traçado das letras é importante e convencional.
Em outras situações da vida a criança para desenhar
uma avião, por exemplo, não tem que se preocupar se o bico está para a direita,
para a esquerda, para cima ou para baixo. Na vida real, ela aprendeu que a
posição dos objetos não muda a identidade deles. É esse conhecimento que ela
traz para o mundo da escrita. Porém, quando descobre que a
posição das letras pode determinar sua identidade,
assim como quando a criança aprende que deve escrever começando próximo da margem
esquerda e direcionar a escrito para a direita, tais espelhamentos começam a desaparecer.
Poucas crianças manifestarão tal dificuldade de modo mais persistente.
Qual a idade certa para alfabetizar?
Aprender a ler e escrever é uma aquisição cultural,
o que significa que não há uma idade pré-determinada para que isso ocorra. A aprendizagem
da linguagem escrita depende fortemente de fatores familiares, socioculturais e
de oportunidades. Por esta razão, crianças que nascem e crescem em ambientes
letrados, que vivem situações sistemáticas de interação com pessoas que lêem e
escrevem, que experimentam situações envolvendo leitura e escrita voltadas para
elas, que têm oportunidade de frequentar as séries da educação infantil, e
quando estão muito motivadas, podem aprender a ler e escrever antes do início
formal da alfabetização, por volta dos 6 ou 7 anos.
Porém, isto não é regra geral e uma minoria de
crianças, em nosso meio, está apta a começar um processo de alfabetização antes
dos 6 anos, mesmo quando condições favoráveis estão presentes. Forçar a
alfabetização precocemente, como muitas vezes ocorre, pode ter o efeito
contrário ao desejado, criando traumas, ansiedade e angústia nas crianças em relação
à aprendizagem da leitura e da escrita. O mais importante, na etapa da educação
infantil é garantir um bom desenvolvimento geral das crianças e, em particular,
de suas habilidades comunicativas gerais.
Qual letra deve ser usada na alfabetização?
A letra chamada “bastão”, de “imprensa” ou de
“forma” maiúscula, é a mais apropriada por ser o tipo mais frequentemente
encontrado nos escritos em geral e também pela facilidade de seu traçado.
As crianças devem aprender a traçar as letras
maiúsculas e também a reconhecer as correspondentes minúsculas, o que lhes
permitirá ler textos, como livros, pois eles vêm impressos com letras de imprensa
maiúsculas e minúsculas. Na medida em que a criança comece a dominar com segurança
o processo de alfabetização, a letra cursiva pode ser progressivamente introduzida
uma vez que é a mais comumente usada para a escrita manual.
Devemos corrigir os erros de escrita ou esperar que as crianças construam hipóteses ortográficas espontaneamente?
Os erros ortográficos devem ser sistemática e
adequadamente trabalhados durante todo o processo escolar uma vez que o risco
de errar está sempre presente, mesmo em pessoas que têm bom domínio da
linguagem escrita. Aguardar que a criança, por conta própria, construa as hipóteses
ortográficas corretas tem se mostrado uma medida com resultados desfavoráveis,
manifestados no grande número de erros que alunos, já em séries mais avançadas,
ainda cometem quando escrevem.
Quem lê bastante, escreve bem: Falso ou Verdadeiro?
Seria muito bom se somente a prática constante da
leitura fosse suficiente para levar as crianças a dominar a ortografia em toda
a sua complexidade. Curiosamente, muitas crianças que são leitoras ativas,
apesar de toda a destreza que mostram nessa atividade, na hora em que vão escrever
cometem muitos erros. A principal razão para este fato é que quem lê está fundamentalmente
preocupado em compreender o significado do texto e não em analisar como as
palavras estão escritas. Isso significa que bons leitores nem sempre dão
atenção a detalhes ortográficos.
Não há dúvida quanto ao fato de que ler bastante
pode ajudar no domínio da escrita, o que não dispensa um cuidado especial em
preparar atividades especialmente voltadas para o ensino da ortografia, diretamente
aplicadas ao ato de escrever.
Posso deixar a criança ficar pronunciando os sons das palavras enquanto escrever ou ela tem que aprender a escrever sem falar?
Os sistemas de escrita alfabéticos envolvem
relações entre letras e sons da fala. Em razão de tal associação, é muito comum
que as crianças analisem a pronúncia das palavras, articulando sílaba por
sílaba, lentamente, para poderem identificar os sons presentes na fala e daí decidir
as letras que devem usar para escrever.
Essa é uma estratégia bastante natural e útil para
as crianças que estão iniciando uma etapa alfabética. Dependendo do método de
alfabetização, elas podem até mesmo ser incentivadas pela professora a usar tal
procedimento. Na medida em que as crianças avançam na alfabetização, essa
estratégia tende a diminuir gradativamente, tornando-se cada vez mais rara sua
ocorrência.
Quem deve fazer as correções dos erros das crianças: os professores ou os pais?
O objetivo de corrigir os erros que as crianças
fazem quando escrevem é bastante claro: levá-las a aprimorar a arte de escrever
bem. Porém, a forma geralmente adotada pelos adultos, quer sejam os pais ou
professores, dificilmente leva aos resultados desejados. Nesta dinâmica, a
criança escreve e alguém corrige, apontando os erros encontrados e, raramente,
conseguindo explicar o porquê dos mesmos. Na realidade, a própria criança deve
aprender a se corrigir. Escrever bem não significa escrever sem errar.
Todos cometem erros ao escrever, porém, aqueles que
aprendem a monitorar ou controlar a própria escrita, sendo capazes de
identificar aspectos ortográficos ou gramaticais que podem gerar erros, são os
que mais bem escrevem. Portanto, mais do que corrigir pela criança, todos devem
educá-la no sentido de que ela mesma desenvolva esse tipo de procedimento, de
controle contínuo e atendo da produção escrita.
O que é o método fônico?
O método ou abordagem fônica corresponde a um conjunto
de procedimentos que têm como objetivo levar as crianças a compreender a natureza
da escrita alfabética, mais precisamente que existem relações entre sons da fala,
por um lado, e as letras correspondentes a tais sons, por outro. Em geral, as
crianças são levadas a descobrir que as palavras faladas podem ser divididas em
sílabas e que, dentro das sílabas existem unidades menores de sons, que são os
chamados fonemas. Por exemplo, na palavra “barato”, temos os fonemas “b - a - r
- a - t - o”, que podem ser pronunciados um a um.
A criança deve aprender a relacionar tais sons com
as letras que podem representá-los na escrita. Podemos comparar a um jogo de
quebra--cabeças: a criança deve aprender a desmontar as palavras, passando
pelas sílabas até chegar aos fonemas, assim como deve aprender a montá-las
fundindo os fonemas em sílabas e as sílabas em palavras. Dessa forma, quando
vai ler uma palavra, as crianças transformam progressivamente letras nos sons
correspondentes até formar uma palavra falada. Contrariamente, quando escrevem,
as crianças devem pensar nos sons que a palavra falada possui e dai decidir
qual a letra que usarão para representá-los.
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